DA PLURALIDADE
DAS EXISTÊNCIAS
Os espíritos que seguem o caminho do bem nem por isso são espíritos perfeitos... precisam adquirir a experiência e os conhecimentos indispensáveis...
1. OBJETIVOS DA ENCARNAÇÃO
Deus impõe aos espíritos a encarnação, com o objetivo de os fazer chegar à perfeição e colaborar, na parte que lhes toca, na obra da criação. Todos os espíritos são criados simples e ignorantes e instruem-se nas lutas e tribulações da vida corporal. Os anjos, arcanjos, querubins, serafins são a representação, para os homens, daquelas almas que, pelo seu esforço, já atingiram a elevação espiritual. Os espíritos que seguem o caminho do bem nem por isso são espíritos perfeitos... precisam adquirir a experiência e os conhecimentos indispensáveis para alcançar a perfeição. Os espíritos não podem conservar-se eternamente nas ordens inferiores, embora dependendo deles o progredirem mais ou menos rapidamente em busca da perfeição. Podem permanecer estacionários durante algum tempo, porém não retrogradam. A encarnação é necessária para o duplo progresso - moral e intelectual - do espírito. Uma só existência corporal é insuficiente para o espírito adquirir todo o bem que lhe falta e eliminar o mal que lhe sobra. Deus concede ao espírito tantas encarnações quantas as necessárias para ele atingir a perfeição. Com a pluralidade das existências explica o homem todas as aparentes anomalias da vida humana; as diferenças sociais; as mortes permaturas; a desigualdade de aptidões intelectuais e morais. Desaparecem os preconceitos de raça e de casta, pois o mesmo espírito pode tornar a nascer rico ou pobre, capitalista ou proletário, chefe ou subordinado, livre ou escravo, homem ou mulher. A reencarnação é um processo de aperfeiçoamento espiritual. Não há experiência reencarnatória sem motivo. O pensamento reencarnacionista está inscrito na oração: Nascer, morrer, renascer ainda, progredir sempre, tal é a lei. Os espíritos melhoram-se evitando o mal e praticando o bem.
2. REENCARNAÇÃO
2.1. JUSTIÇA DA REENCARNAÇÃO
A reencarnação é a única forma racional por que se pode admitir a reparação das faltas cometidas e a evolução gradual dos seres. Todos os espíritos tendem para a perfeição, e Deus lhes faculta os meios de alcançá-la, proporcionando-lhes as provações da vida corporal. Se a sorte do homem se fixasse irrevogavelmente depois da morte, não seria uma única a balança em que Deus pesa as acções de todas as criaturas e não haveria imparcialidade no tratamento que a todas dispensa. A doutrina da reencarnação é a única que corresponde à ideia que formamos da justiça de Deus para com os homens que se acham em condição moral inferior; a única que pode explicar o futuro e firmar as nossas esperanças, pois oferece-nos os meios de resgatarmos os nossos erros, por novas provações. A razão no-la indica e os espíritos a ensinam.
2.2. REENCARNAÇÃO E RESSURREIÇÃO
A reencarnação fazia parte dos dogmas dos judeus, sob o nome de ressurreição. Criam eles que um homem que vivera podia reviver, sem saberem precisamente de que maneira o facto poderia dar-se. A ressurreição dá ideia de voltar à vida o corpo que já está morto, o que a ciência demonstra ser materialmente impossível. A reencarnação é a volta da alma, ou espírito, à vida corpórea, mas noutro corpo, especialmente formado para ele, e que nada tem de comum com o antigo. A ressurreição podia ser aplicada a Lázaro, mas não a Elias, nem aos outros profetas.
2.3. REENCARNAÇÃO E METEMPSICOSE
O espírito não pode encarnar num corpo de animal, como entende a doutrina da metempsicose, pois isso seria retrogradar, e o espírito não retrograda. É falsa a ideia da metempsicose no sentido da transmigração directa da alma do animal para o homem, e reciprocamente, o que implicaria a ideia de uma retrogradação. A reencarnação funda-se na marcha ascendente da natureza e na progressão do homem, dentro da sua própria espécie, o que em nada lhe diminui a dignidade. Emmanuel explica que a doutrina da metempsicose surgiu com os egípcios, como reminiscência do seu doloroso degredo na face obscura do mundo terreno. Pitágoras foi o primeiro personagem que introduziu na Grécia a doutrina dos renascimentos da alma. Ele tinha duas doutrinas: a reservada aos iniciados, que frequentavam os mistérios, e outra destinada ao povo, que deu nascimento ao erro da metempsicose.
2.4. REVISÃO HISTÓRICA SOBRE A TEORIA DAS VIDAS SUCESSIVAS
A doutrina das vidas sucessivas, ou reencarnação, é também chamada palingenesia, de duas palavras gregas - palin, de novo, e genesis, nascimento. Foi formulada nos albores da civilização, na Índia. Os povos da Ásia e da Grécia acreditaram na imortalidade da alma e procuravam saber se fora criada no momento do nascimento ou se existia antes. Nos Vedas e no Bhagavad Gita encontram-se citações sobre a pluralidade das vidas. A religião da Pérsia, o mazdeísmo, apresentava uma concepção muito elevada, a da redenção final, após várias provas expiatórias. Platão apresenta, no Fedon, a teoria das vidas sucessivas, na afirmação "aprender é recordar". A escola neo-platónica de Alexandria, com Plotino, Porfírio e Jâmblico, ensinava a reencarnação. Os romanos, através de Virgílio e Ovídio, falam das vidas sucessivas. Os gauleses praticavam a religião dos druidas e acreditavam na unidade de Deus e nas vidas sucessivas. Descartes, Leibnitz e Kant tiveram certa intuição dessa doutrina. O bramanismo, o budismo, o druidismo, o islamismo baseiam-se na crença das vidas sucessivas. O cristianismo primitivo não abriu excepção à regra. Orígenes, Clemente de Alexandria e a maior parte dos cristãos dos primeiros séculos admitiam a doutrina da palingenesia.
2.5. A REENCARNAÇÃO NA BÍBLIA E NOS EVANGELHOS
A ideia das vidas anteriores era geralmente admitida entre os hebreus. A Bíblia e os Evangelhos apresentam inúmeras citações que indicam a doutrina das vidas sucessivas. Isaías, cap. XXVI, v.19: "Aqueles do vosso povo a quem a morte foi dada viverão de novo; aqueles que estavam mortos em meio a mim ressuscitarão". Job, cap. XIV, v.10 a 14: "Quando o homem está morto, vive sempre; acabando os dias da minha existência terrestre, esperarei, porquanto a ela voltarei de novo". S. Mateus, cap. XVI, v.13 a 17 - S. Marcos, cap. VIII, v. 27 a 30: "... porque uns diziam que João Baptista ressuscitara dentre os mortos; outros que aparecera Elias; e outros que um dos antigos profetas ressuscitara...". S. Mateus, cap. XVII, v.10 a 13; S. Marcos, cap. IX, v.11 a 13: "... É verdade que Elias há-de vir e restabelecer todas as coisas, mas eu vos declaro que Elias já veio e eles não o conheceram e o trataram como lhes aprouve... Então seus discípulos compreenderam que fora de João Baptista que ele falara". S. João, cap. III, v.1 a 12: "... Jesus lhe respondeu: "Em verdade, em verdade, digo-te, ninguém pode ver o reino de Deus se não nascer de novo". Disse-lhe Nicodemos: "Como pode nascer um homem já velho? Pode tornar a entrar no ventre de sua mãe, para nascer segunda vez?". Retorquiu-lhe Jesus: ... "Não te admires de que eu te haja dito ser preciso que nasças de novo"... Respondeu-lhe Nicodemos: "Como pode isso fazer-se?". Jesus lhe observou: "Pois quê! És mestre em Israel e ignoras estas coisas?"... Esta última observação de Jesus demonstra que a reencarnação era ensinada aos intelectuais da época. Existiam ensinos secretos, reservados aos iniciados, que foram compilados nas diferentes obras dos hebreus e que constituem a Cabala. Sob o nome de ressurreição, era a reencarnação ponto de uma das crenças fundamentais dos judeus. Sem o princípio da preexistência da alma e da pluralidade das existências são ininteligíveis, na sua maioria, as máximas do Evangelho. Somente o princípio da reencarnação dará a essas máximas o sentido verdadeiro.
2.6. REENCARNAÇÃO E EVOLUÇÃO ANÍMICA
O princípio inteligente, distinto do princípio material, individualiza-se e elabora-se, passando pelos diversos graus da animalidade. É aí que a alma ensaia para a vida e desenvolve, pelo exercício, as suas primeiras faculdades. Chegada ao grau de desenvolvimento que esse estado comporta, ela recebe as faculdades especiais que constituem a alma humana. O que constitui o homem espiritual não é a sua origem são os atributos especiais de que ele se apresenta dotado ao entrar na humanidade. Por haver passado pela fieira da animalidade, o homem não deixaria de ser homem; já não seria animal, como o fruto não é a raiz, como o sábio não é o feto informe que o pôs no mundo. Uma cadeia ascendente e contínua liga todas as criações, o mineral ao vegetal, o vegetal ao animal, e este ao ente humano... A alma elabora-se no seio dos organismos rudimentares. No animal está apenas em estado embrionário; no homem adquire conhecimento e não mais pode retrogradar. A finalidade da alma é o desenvolvimento de todas as faculdades a ela inerentes. Para consegui-lo, ela é obrigada a encarnar grande número de vezes na Terra, a fim de acendrar as suas faculdades morais e intelectuais. É mediante uma evolução ininterrupta, a partir das formas de vida mais rudimentares, até à condição humana, que o princípio pensante conquista, lentamente, a sua individualidade. Chegado a esse estágio, cumpre-lhe fazer eclodir a sua espiritualidade, dominando os instintos remanescentes da sua passagem pelas formas inferiores, a fim de elevar-se, na série das transformações, para destinos sempre mais altos.
2.7. REENCARNAÇÃO E EVOLUÇÃO DO HOMEM
À medida que o espírito se purifica, o corpo que o reveste aproxima-se igualmente da natureza espírita. Torna-se-lhe menos densa a matéria... menos grosseiras se lhe fazem as necessidades físicas. Da purificação do espírito decorre o aperfeiçoamento moral para os seres que eles constituem, quando encarnados. Quanto menos material o corpo, menos sujeito às vicissitudes que o desorganizam. Quanto mais puro o espírito, menos paixões a miná-lo.
3. DA VOLTA DO ESPÍRITO, EXTINTA A VIDA CORPORAL, À VIDA ESPIRITUAL
No intervalo das existências corporais o espírito torna a entrar no mundo espiritual. Aí é feliz ou desgraçado, conforme o bem ou o mal que fez. O estado corporal é transitório e passageiro. O estado espiritual é o estado definitivo do espírito. É neste estado, sobretudo, que o espírito colhe os frutos do progresso realizado pelo trabalho da encarnação. A situação da alma, depois da morte, é regida por uma lei de justiça infalível, segundo a qual os seres se encontram em condições de existência que são rigorosamente determinadas pelo seu grau evolutivo e pelos esforços que faz para melhorar. A morte do corpo físico é que determina a partida do espírito, não é a partida do espírito que causa a morte do corpo. Por um efeito contrário, a união do perispírito e da matéria carnal, que se efectuara sob a influência do princípio vital do gérmen, cessa desde que esse princípio deixa de actuar, em consequência da desorganização do corpo. Essa separação pode ser rápida, fácil, suave e insensível ou poderá ser lenta, laboriosa, horrivelmente penosa, conforme o estado moral do espírito. Durante a vida, o espírito está preso ao corpo pelo seu perispírito. A morte é a destruição do corpo, somente, não a desse outro invólucro, que do corpo se separa quando cessa neste a vida orgânica. A actividade intelectual e moral, a elevação dos pensamentos operam um começo de desprendimento, mesmo durante a vida do corpo. Na agonia, a alma, algumas vezes, já tem deixado o corpo; nada mais há que a vida orgânica. Por ocasião da morte, tudo, a princípio, é confuso. De algum tempo precisa a alma para entrar no conhecimento de si mesma. A lucidez das ideias e a memória do passado lhe voltam à medida que se apaga a influência da matéria que ela acaba de abandonar. Muito variável é o tempo que dura a perturbação que se segue à morte. A perturbação que se segue à morte nada tem de penosa para o homem de bem; para aquele cuja consciência ainda não está pura, a perturbação é cheia de ansiedade e de angústias, que aumentam à medida que ele da sua situação se compenetra. A alma desencarnada procura, naturalmente, as actividades que lhe eram predilectas nos círculos da vida material. O homem desencarnado procura, ansiosamente, no espaço, as aglomerações afins com o seu pensamento, de modo a continuar o mesmo género de vida abandonado na Terra. Daí a necessidade de encararmos todas as nossas actividades no mundo como tarefa de preparação para a vida espiritual, sendo indispensável à nossa felicidade, além do sepulcro, que tenhamos um coração sempre puro. O conhecimento do espiritismo grande influência tem na duração mais ou menos longa da perturbação espiritual após a morte, pois o espírito já antecipadamente compreendia a sua situação. Mas a prática do bem e a consciência pura são o que maior influência exercem.
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